segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

O fim de ano e a hipocrisia

Conheço algumas pessoas que não suportam o reveillon e nem o natal. Para elas não passa de hipocrisia: os presentes; os votos de felicidade, a forma das pessoas se tratarem... Afinal, depois que o ano começa todos voltam a se ignorar, a trocarem "patadas" e a se prejudicarem normalmente.

Eu sempre achei exagero. Pra mim, nessa época, muita gente se arrependia e tentava "consertar as coisas", dizendo o que não disse no decorrer do ano; dando presentes como forma de pedir perdão, ou como expressão sincera de sentimentos reprimidos; tentando recomeçar, "virar a página", enfim...

Bom, neste fim de ano estou considerando rever meus conceitos. Não tenho dúvidas de que há sinceridade nas tentativas de reconciliação. Mas, se a tentativa dura tão pouco, só até virar o ano, então ela não foi sincera o bastante. A hipocrisia também pode ser involuntária...

E daí? Vamos todos sofrer e amargurar enquanto estouram os fogos? Não, tenho uma idéia melhor: por mais hipócritas que sejam os esforços de reconciliação vamos aproveitar mais este repentino clima de tolerância e demonstrações de afeto para plantar algumas "sementes".
E deixa o tempo cuidar do resto... O que é que o tempo não faz?

segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Pequeno ensaio sobre a felicidade


Náufragos
Vocês já repararam que certas emoções e sentimentos não conseguem coexistir? A timidez desaparece diante da alegria; o medo some quando nos sentimos seguros; a raiva se desfaz quando enternecidos... Já a experiência "estar em paz", às vezes, é fruto de uma grande euforia; e sentir alternadamente ódio e rancor parece ser inevitável.

Desta observação podemos concluir que as sensações, emoções, sentimentos que experimentamos não são apenas reflexos dos estímulos recebidos. Há como que regras de combinação entre as emoções que ajudam a definir a mudança de um estado de espírito para outro. Isso talvez explique porque às vezes não conseguimos rir diante daquilo que, normalmente, achamos divertido...

A busca da felicidade parece ter relação justamente com este mecanismo da mudança do estado de espírito. Por que não podemos continuar em paz indefinidamente? Por que alegria "de pobre" dura pouco? Por que tantas vezes saímos da experiência de um sentimento dito positivo para um necessariamente oposto? A vida humana parece transcorrer numa contínua oscilação entre diversos estados emocionais: ansiedade, desespero, alegria, paz, prazer, medo, ódio, esperança...
Passamos cada dia da nossa existência, desde a hora de acordar até durante o sono, sendo levados de uma emoção para outra. Como náufragos em alto-mar.

O ciclo da felicidade
Há quem diga que a felicidade consiste nos momentos em que experimentamos certas emoções "positivas". Desse modo, não há nada a fazer além de continuar buscando e buscando sem nunca conquista-la, mas, sentindo-nos felizes algumas vezes.

Porém, a existência de certas pessoas permanentemente de "bem com a vida", sempre com um sorriso nos lábios, parece contradizer esta visão. E um olhar mais demorado sobre essas pessoas revela que estão em todas as classes sociais e tem os mais diversos estilos de vida. Há casados, solteiros, ateus, crentes, pais, filhos, patrões, empregados... Em cada grupo parece haver um punhado de sortudos para quem a vida é sempre azul. Sorte?

Estas criaturas afortunadas demonstram que existe um estado de espírito que se pode chamar felicidade. E que se pode alcançá-lo e permanecer nele por bastante tempo. A vida inteira, talvez.

Ora, a felicidade, assim entendida, seria um estado onde oscilaríamos apenas entre sentimentos positivos. Da paz para a alegria. Da alegria para a esperança. Da esperança para o bem estar. Do bem estar para a euforia. Da euforia para o enternecimento. Do enternecimento para a segurança. Da segurança para... Talvez, seja isso que acontece com as "pessoas felizes". E, vista assim, a felicidade parece possível.

Mesmo considerando que neste ciclo eterno de emoções positivas pode, algumas vezes brotar alguma "impureza": uma vaga tristeza, uma raiva passageira... de modo geral, alguém que viva neste "clima mental" é com certeza um felizardo.

Já um outro ciclo onde se alternem o desespero, o medo, o ódio, a ansiedade, o rancor, o ciúme, etc., pode muito bem caracterizar a infelicidade. E entre estes dois ciclos podemos reconhecer as várias gradações que caracterizam o estado de espírito habitual de cada um de nós.

Autoconhecimento
Sendo o "clima mental" de cada um fortemente afetado pelos estímulos recebidos, por fatores externos, cenas, fatos, conversas, pelos reveses da vida... Talvez devêssemos controlar o meio externo como forma de impedir que estímulos negativos perturbem o nosso estado interior. Mas, não... A experiência mostra que não é viável tentar controlar tudo à nossa volta. O próprio esforço para manter algum nível de controle proporciona tensão, ansiedade, decepções e outras emoções negativas... A solução deve se dar dentro da mente.

Sabemos que as pessoas tem diferentes formas de reagir aos mesmos estímulos. O que causa raiva em um faz rir ao outro; o que comove um entedia ao outro, e assim por diante. Penso que se aprendermos, para cada estímulo, a forma de reagir que melhor favorece o "clima mental" aprenderemos a ser felizes. Trata-se de aprender a lidar com nossas vidas de uma maneira que leve em conta não apenas os interesses financeiros, profissionais, políticos, passionais... Mas, sempre, leve em conta a felicidade! Não é ela o objetivo maior de todos nós?

A filosofia budista sempre defendeu que o autoconhecimento progressivamente conduz o ser humano ao "ananda", ou seja ao estado da felicidade suprema. Talvez isso seja mais prático do que aparenta. Se precisamos aprender novas formas de reagir ao mundo para sermos felizes faz sentido que devamos nos conhecer melhor. Isto é, entender nossa maneira atual de lidar com a vida para que, entendendo, alcancemos o controle das nossas reações. Conhecimento não é poder? Então autoconhecimento é poder sobre si mesmo.

É possível aumentar consideravelmente a quantidade de emoções positivas que a gente experimenta, através do autoconhecimento. E, se não alcançarmos o "ananda", pelo menos nos sentiremos menos infelizes que antes.

Ser feliz
Será mesmo possível sempre reagir ao mundo de modo a se sentir bem? Nossas escolhas podem nos fazer ganhar ou perder. Mas, depende muito do que se considera perder... Quando escolhemos preservar nosso "clima" interior poderemos estar abdicando de coisas exteriores que talvez façam falta... E, se fizerem, talvez não fiquemos tão felizes...

O problema é que se sentimos falta daquilo que não nos ajuda a ser felizes, significa que não desejamos a felicidade tanto assim...